O ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), tenente-coronel Mauro Cid, foi interrogado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta segunda-feira (9).
Cid respondeu questões sobre sua delação premiada no processo que apura uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
Ao chegar na sala da Primeira Turma, Cid cumprimentou os outros réus do processo, incluindo o ex-presidente Bolsonaro, com um aperto de mão e prestou continência aos militares presentes. Depois, sentou-se isolado, aguardando o início do depoimento.
O interrogatório foi conduzido por Moraes e contou com a presença do também ministro Luiz Fux, o único integrante da Primeira Turma a participar. A CNN separou os principais pontos do interrogatório do ex-ajudante de ordens, leia abaixo:
Bolsonaro editou a minuta golpista
Cid confirmou ao STF que houve discussão e elaboração de uma minuta de decreto pensada para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo ele, o documento previa, inicialmente, a decretação de estado de defesa e a prisão de uma série de autoridades.
Bolsonaro teria então removido os trechos que falavam sobre prisão, mantendo somente a de Moraes.
“Ele enxugou o documento. Basicamente, retirando as autoridades das prisões, somente o senhor [Alexandre de Moraes] ficaria como preso”, disse.
Pressão militar
Cid afirmou que havia grande pressão dentre militares da ativa para que houvesse alguma ação para manter Bolsonaro no poder. De acordo com o depoimento, militares cogitaram se movimentar para trocar os comandantes das Forças Armadas caso eles não concordassem com a trama golpista. A ideia seria colocar alguém mais radical no comando das Forças.
Cid disse ainda que o próprio ex-presidente sofria grande pressão para assinar decretos de estado de sítio ou de defesa.
“Se o general Freire Gomes não fosse fazer nada, uma das alternativas seria trocar os comandantes para que o próximo comandante do Exército assinasse ou tomasse uma medida mais dura e radical. Isso estava dentro daquele contexto de pressionar o presidente a assinar um decreto”, disse Cid.
Acampamentos no QG
Cid disse que o ex-ministro Walter Braga Netto era o “elo” entre Bolsonaro e os manifestantes acampados no Quartel-General do Exército. Segundo o tenente-coronel, após as eleições de 2022, Bolsonaro ficou mais recluso no Palácio do Alvorada e Braga Netto era quem atualizava o ex-presidente sobre os acontecimentos todos os dias.
Cid relatou ainda que Bolsonaro nunca deu ordens para desmobilizar os acampamentos, que a visão do ex-presidente era de que se não foi ele quem chamou, não seria ele quem mandaria os manifestantes embora.
Em outro momento, Cid afirmou que Braga Netto conseguiu verba para ajudar a financiar os acampamentos após pedido do major Rafael de Oliveira, um “kid preto”.
Oliveira teria pedido R$ 100 mil ao tenente-coronel para manter os acampamentos. O ex-ajudante de ordens disse então ter procurado Braga Netto, que lhe indicou a pedir o dinheiro para o PL.
Após a recusa do partido, Cid relatou que Braga Netto arrumou o dinheiro e entregou a ele em uma sacola de vinho. O tenente-coronel afirmou não saber precisar o valor, mas que parecia menos de R$ 100 mil pelo volume.
Fraude nas urnas
Cid afirmou ao Supremo que a “grande preocupação” de Bolsonaro sempre foi encontrar fraude nas urnas eletrônicas, no entanto, nenhum indício de irregularidade foi achado.
Segundo Cid, Bolsonaro e Braga Netto apostavam na comprovação de fraude para convencer as Forças Armadas a aderirem a trama golpista.
Cid relatou que a deputada federal licenciada Carla Zambelli (PL-SP) agendou uma reunião entre Bolsonaro e o hacker Walter Delgatti no Palácio do Alvorada para discutir as possibilidades de as urnas serem fraudadas e como descobrir essas fraudes. A intenção era ter um ponto de vista técnico.
Após a reunião, Bolsonaro pediu que Paulo Sérgio recebesse Zambelli e o hacker para aprofundar as discussões. Cid disse que essa segunda reunião chegou a acontecer no Ministério da Defesa, mas não sabe dizer se Paulo Sérgio participou.
Delação voluntária
Mauro Cid negou ter sido coagido ou pressionado a assinar o acordo de delação premiada. Questionado por Moraes sobre áudios divulgados pela revista Veja em que ele dizia ter sido pressionado a delatar, Cid afirmou ter sido um momento de desabafo com amigo próximo e disse não saber como os áudios chegaram à imprensa.
“Foi um vazamento de áudio sem meu consentimento, um desabafo de um momento difícil que eu e minha família estávamos passando. Eu vendo minha carreira militar desabando, minha vida financeira desabando, isso gerou uma crise psicológica muito grande e me levou a um certo desabafo a amigos, nada de maneira oficial ou acusatória”, afirmou.
Durante interrogatório, Luiz Fux voltou a questionar a quantidade de depoimentos feitos durante a delação de Cid. O tenente-coronel afirmou que fez um grande relato num primeiro momento e, depois, foi chamado pela Polícia Federal para fazer complementações, como identificar situações e determinadas pessoas, mas não para relatar fatos novos.
Negou participação
Mauro Cid negou em interrogatório que as acusações contra ele sejam verdadeiras. O tenente-coronel afirmou que presenciou os fatos mencionados na denúncia da Procuradoria-Geral da República, mas que não participou ativamente deles.