Parte dos 2.000 soldados da Guarda Nacional enviados pelo governo de Donald Trump chegou a Los Angeles neste domingo (8) para conter os protestos contra as operações anti-imigração na cidade.
Trump fez uso de sua prerrogativa e assumiu o controle das forças de segurança do estado da Califórnia para mobilizar soldados na segunda maior cidade do país —uma medida inédita nas últimas décadas e considerada “deliberadamente provocadora” pelo governador Gavin Newsom, do Partido Democrata, que falou em pelo menos 300 soldados já em ação.
Homens com capacetes, armas automáticas e veículos camuflados foram vistos em Los Angeles desde as primeiras horas do domingo. Um contingente maior se concentrou ao redor de prédios como o Edward R. Roybal, que funciona como sede de tribunais e de agências do governo federal, incluindo o FBI e o ICE, o serviço de imigração dos EUA.
Conteúdo relacionado
Uma “mobilização massiva” contra as batidas migratórias foi convocada em frente à prefeitura durante a tarde (18h no horário de Brasília). O entorno de um centro de detenção, para onde foi enviada parte dos detidos nas operações dos últimos dias, também se tornou um dos pontos de maior tensão.
A Guarda Nacional é uma força militar de reserva geralmente acionada em emergências como desastres naturais e, ocasionalmente, em distúrbios civis —quase sempre com o aval das autoridades locais. Pouco antes da sua chegada a Los Angeles, ainda não estava claro como os soldados atuariam, segundo o jornal The New York Times. O contingente foi instruído sobre as regras para o uso da força, mas o Pentágono não disse publicamente quais são elas.
Este domingo é o terceiro dia de protestos na cidade e, assim como na sexta e no sábado, agentes federais lançaram bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo contra uma multidão que protestava contra a prisão de dezenas de migrantes em uma cidade com forte presença latina. As autoridades falam em mais de cem detidos, mas não está claro quantos seriam em decorrência das operações do ICE ou dos atos de contenção dos protestos.
Segundo o jornal The Washington Post, Los Angeles estava relativamente mais calma neste domingo do que nos dias anteriores. O discurso de Trump, contudo, manteve-se acirrado. “Se virmos perigo para nosso país e para nossos cidadãos, haverá uma resposta muito, muito firme em termos de lei e ordem”, disse o presidente.
O Departamento de Polícia de Los Angeles entrou em modo de alerta tático, o que significa que a corporação elevou seu nível de prontidão. Essa medida permite uma resposta mais rápida e coordenada diante de situações que ameaçam a ordem pública, como protestos de grande escala, distúrbios civis ou outros eventos com potencial de agravamento.
Além de Trump, outros membros do Partido Republicano ignoraram os alertas do governador Newsom e de outros líderes democratas locais de que a repressão poderia agravar as tensões. Membros dos dois partidos trocaram farpas neste domingo.
“Não estou nem um pouco preocupado”, disse o presidente republicano da Câmara, Mike Johnson, à ABC. Ele afirmou que Newsom “demonstrou incapacidade ou falta de vontade, o que motivou a intervenção do presidente”. Johnson também apoiou a possibilidade de acionar fuzileiros navais da ativa, além da Guarda Nacional — hipótese cogitada no sábado pelo secretário de Defesa, Pete Hegseth. “Precisamos estar preparados para fazer o que for necessário”, argumentou.
Em posts na Truth Social, Trump disse que o governador da Califórnia e a prefeita de Los Angeles, Karen Bass, “não conseguem fazer seus trabalhos” e, por isso, o governo “intervirá e resolverá o problema da maneira como deveria ser resolvido”.
Ele elogiou e agradeceu o trabalho da Guarda Nacional. “Esses protestos da esquerda radical não serão tolerados. Além disso, a partir de agora, não será permitido o uso de máscaras em protestos. O que essas pessoas têm a esconder?”, escreveu ainda.
Segundo o governador da Califórnia, as autoridades federais “querem um espetáculo”. “Não deem isso a eles. Nunca usem violência. Falem pacificamente”, escreveu Newsom no X ainda na noite de sábado, chamando de insana a ameaça feita por Hegseth.
“Eles querem nos ver fracassar”, disse a manifestante Julie Solis, primeira pessoa de uma família de imigrantes a nascer na Califórnia, ao New York Times. “Estão procurando uma desculpa para implementar a lei marcial, e não podemos dar essa satisfação a eles.”
É a primeira vez desde 1965 que um presidente envia essa força sem o pedido de um governador estadual, afirmou Kenneth Roth, ex-diretor da ONG Human Rights Watch, acusando Trump de “criar um espetáculo para continuar suas batidas migratórias”.
Naquele ano, o presidente Lyndon B. Johnson enviou tropas ao Alabama para proteger os manifestantes dos direitos civis da violenta repressão pelas forças locais. Um dos episódios históricos da ocasião ficou conhecido como “Domingo Sangrento”, quando os manifestantes, em sua maioria negros, foram brutalmente atacados na ponte Edmund Pettus enquanto reivindicavam direito ao voto.
A secretária de Segurança Interna dos EUA, Kristi Noem, cuja pasta é responsável pelo ICE, defendeu a decisão do presidente e disse que a Guarda Nacional está “especialmente treinada para esse tipo de situação com grandes multidões”.
Quer ver mais notícias? Acesse nosso canal no WhatsApp
Trump tem cumprido sua promessa de reprimir com rigor a entrada e permanência de imigrantes em situação irregular no país, aos quais já comparou a monstros e animais.
As operações do ICE em outras cidades americanas provocaram protestos nos últimos meses, mas os distúrbios em Los Angeles são os maiores e mais duradouros contra as políticas do governo Trump até agora.