BRASÍLIA — “O senhor certamente está ciente do declínio dos direitos humanos no Brasil”, afirmou o deputado republicano Cory Mills numa sessão da Câmara dos Deputados americana em 21 de maio, referindo-se ao secretário de Estado, Marco Rubio. “E o que eles estão fazendo agora é uma prisão eminente e politicamente motivada contra o ex-presidente Bolsonaro. O senhor estaria considerando impôr sanções ao ministro da Suprema Corte Alexandre de Moraes?”
A pergunta, que rendeu uma resposta direta de Rubio — “Há uma grande possibilidade de que aconteça” — expôe o suporte que parlamentares republicanos têm dado aos planos de Eduardo Bolsonaro (PL-SP). O deputado federal, licenciado do mandato em março para ficar nos Estados Unidos, diz se empenhar para convencer o governo Trump a aplicar sanções contra autoridades de seu próprio País.

Eduardo Bolsonaro, Paulo Figueiredo, Cory Mills e Filipe Barros em reunião em 14 de maio de 2025 em Washington Foto: Reprodução/X
Além de Mills, da Flórida, os deputados Maria Elvira Salazar (Flórida), Rich McCormick (Geórgia), Jim Jordan (Ohio), Chris Smith (Nova Jersey) e Brian Mast (Flórida) e o senador federal Mike Lee (Utah) formam uma espécie de “bancada anti-Moraes” no Capitólio dos Estados Unidos. O grupo é reforçado pelo senador estadual Shane David Jett (Oklahoma). Entre assuntos domésticos e internacionais, eles têm direcionado críticas ao Brasil — principalmente contra Moraes.
Esses parlamentares são os principais aliados de Eduardo no Legislativo americano, e com quem o brasileiro têm feito reuniões em solo americano para discutir as investigações contra o seu pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro. A articulação de Eduardo tem a parceria do deputado federal Filipe Barros (PL-PR) e do comunicador Paulo Figueiredo, que mora nos Estados Unidos.
Na semana anterior à pergunta a Rubio, Mills, que é presidente do Sub-comitê de Inteligência das Relações Internacionais da Câmara americana, reuniu-se com Eduardo, Figueiredo e Barros, que preside a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN) da Câmara dos Deputados do Brasil. Barros diz que combinou com Mills de criarem “um grupo de trabalho que trocará informações importantes sobre a democracia brasileira e possíveis interferências no nosso processo eleitoral”.
Filha de exilados cubanos, Salazar também adotou a pauta de Eduardo. Em maio de 2024, ela chegou a exibir um cartaz com o rosto de Moraes no Congresso americano enquanto criticava suas decisões judiciais. Na quarta-feira, 28, ela elogiou a decisão de Rubio de restringir visto para “autoridades estrangeiras e pessoas cúmplices na censura de americanos”. Mais cedo, o secretário de Estado havia mencionado a América Latina como um dos exemplos de aplicação.
“Que isso sirva de alerta aos tiranos e aos simpatizantes autoritários ao redor do mundo como Alexandre de Moraes: se você tentar censurar cidadãos americanos, mesmo além de nossas fronteiras, você não será bem-vindo nos Estados Unidos”, escreveu Salazar no X (antigo Twitter).

Eduardo Bolsonaro e a deputada americana Maria Elvira Salazar Foto: Reprodução/X
Mast é outro a se encontrar com Eduardo. O encontro foi no dia 15 de maio. As pautas da reunião, segundo Barros, foram “o lawfare e o ativismo judicial, a preocupação com o avanço da censura, a interferência da USAID na democracia, a proliferação das facções criminosas e a necessidade de as considerarmos como movimentos terroristas”.
Em fevereiro, McCormick publicou uma foto de um encontro com Eduardo, disse ter sido ótimo revê-lo e que o mundo não deve fechar os olhos às “ameaças que as liberdades enfrentam no Brasil”. Ele repercutiu uma teoria da conspiração segundo a qual recursos americanos teriam sido usados para interferência nas eleições de 2022 no Brasil. “O povo livre dos Estados Unidos e do mundo está com o povo do Brasil contra o comunismo e a corrupção!”, escreveu ele no Instagram.
Um mês depois, após Eduardo anunciar seu autoexílio nos Estados Unidos, McCormick afirmou que ele e e sua colega Maria Elvira Salazar tinham enviado a Trump uma carta pedindo a aplicação do Global Magnitsky Act contra Moraes. Trata-se de uma lei que permite ao governo americano impor sanções contra autoridades de outros países que violem direitos humanos, incluindo o congelamento de seus ativos e sua proibição de entrar nos Estados Unidos.
“O fato de Eduardo Bolsonaro, o mais votado deputado federal na história do Brasil e filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, ter sido forçado a procurar exílio nos Estados Unidos demonstra a alarmante deterioração na democracia do maior país da América do Sul”, escreveu McCormick em 20 de março. Naquela ocasião, Shane Jett, senador de Oklahoma e casado com uma brasileira, disse que “Moraes está brincando com fogo”.
Outros representantes da “bancada anti-Moraes” atuam contra o ministro brasileiro. Fundador de um grupo que reúne deputados ultraconservadores, Jim Jordan preside o comitê que divulgou relatório com documentos sigilosos sobre suposta “censura do governo brasileiro” a redes sociais.
Chris Smith, por sua vez, enviou uma carta a Moraes no ano passado pedindo que o STF derrubasse a suspensão do X. Já o senador Mike Lee, que já se referiu ao menos duas vezes a Moraes como o “Voldemort brasileiro”, em referência ao vilão da série Harry Potter, foi outro a se reunir com Eduardo e Figueiredo em fevereiro.
Na quinta-feira, 29, escreveu no X: “Obrigado, Secretário Rubio! Este é um bom primeiro passo para o juiz brasileiro Alexandre de Moraes. O Global Magnitsky Act deve ser o próximo passo, e eu o encorajo a acelerar sua análise sobre a possibilidade de sancionar Moraes, responsabilizá-lo por seus ataques à democracia no Brasil e impedi-lo de emitir ordens secretas visando censurar americanos em solo americano!”
Eduardo vem provocando nos últimos dias os críticos que zombavam de sua atuação no exterior. Após a resposta de Rubio a Mills, ele escreveu nas redes sociais: “Antes, eu era chacota. Hoje, vocês me levam a sério o suficiente para me ameaçarem”, tomando para si parte da responsabilidade pelas decisões do governo Trump.
Procurados, Barros e Eduardo não responderam. O deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), membro da CREDN, disse não haver hoje no colegiado qualquer formalização de um grupo de trabalho binacional com o Congresso americano, como mencionado pelo bolsonarista no encontro com Mills. E chama a articulação de Eduardo de “criminosa”.
“Isso é crime de lesa-pátria, é uma traição instigar um país poderoso como os Estados Unidos contra o Brasil. A gente vai defender nossa soberania, e o STF vai defender o seu direito de tomar suas decisões. Não vai haver recuo”, afirma.
O PT entrou com uma representação na Procuradoria-Geral da República (PGR) pedindo prisão de Eduardo por atentado à soberania nacional, e na comissão de ética da Câmara pela cassação do deputado. Zarattini diz que o partido vai fazer “tudo o que for possível” para denunciar o bolsonarista.