Ao tornar réus sete acusados de integrarem o “núcleo da desinformação” da trama golpista, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu pistas sobre de assuntos que devem ser abordados na retomada do julgamento sobre a responsabilização das redes sociais pelos conteúdos ilegais postados pelos usuários. A análise está suspensa desde o ano passado, mas deve voltar ainda neste semestre.
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Nesta terça-feira, os ministros se debruçaram sobre a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) relativa ao chamado “núcleo 4”, composto por pessoas acusadas de atuar com táticas de desinformação, desacreditando o sistema eleitoral e atacando autoridades que não aderiram à trama golpista.
Por isso, o julgamento foi marcado por falas de todos os ministros a respeito do papel das redes sociais e do caráter danoso causado pela distribuição de desinformação. Segundo o procurador-geral da República, Paulo Gonet, os membros desse grupo “propagaram notícias falsas sobre o processo eleitoral e realizaram ataques virtuais a instituições e autoridades que ameaçavam os interesses do grupo”.
Nos bastidores do Supremo, as falas foram vistas como indicativos de que o debate, ao ser retomado, deve passar por elementos apresentados pelos ministros que integram a Primeira Turma. Além de Alexandre de Moraes, que é o relator e fez uma série de considerações a respeito dos mecanismos de propagação de notícias falsas, os ministros Cármen Lúcia, que é presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e Flávio Dino, falaram sobre aspectos nocivos do uso desenfreado das tecnologias.
A expectativa na Corte é que o julgamento das redes possa ser retomado ainda neste semestre, uma vez que o prazo para que o ministro André Mendonça — que pediu vista do caso — devolva o processo termina no dia 21 de maio. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, tem dito a interlocutores que pautará o caso assim que a ação for liberada.
Ao votar pelo recebimento da denúncia contra o núcleo 4, Moraes afirmou que as plataformas digitais não têm natureza intrinsecamente boa ou má, enfatizando que o seu impacto na sociedade depende exclusivamente da forma como são utilizadas.
— Não se pode, de maneira alguma, relativizar a força, que pode ser uma força maléfica, das redes sociais. As redes sociais não são boas nem ruins. Aqueles que as utilizam, podem utilizar de forma boa ou não — disse.
Segundo o ministro, as redes sociais constituem um meio poderoso, com ampla capacidade de alcance, que pode servir tanto à promoção do debate democrático e à liberdade de expressão quanto à disseminação de conteúdos antidemocráticos, como a desinformação.
Moraes chamou atenção para a instrumentalização maliciosa dessas ferramentas por indivíduos e organizações com interesses escusos, que as empregam para espalhar notícias falsas sobre o sistema eleitoral e fomentar desconfiança em relação aos poderes constituídos.
Já Cármen Lúcia afirmou que a mentira se tornou uma commodity usada como ferramenta de corrosão institucional e destacou que, hoje, a desinformação não é apenas um meio, mas sim uma estratégia ofensiva à democracia, potencializada pelas novas tecnologias e pelas redes sociais.
— A mentira é um veneno político plantado socialmente e exponencialmente divulgado por redes, por plataforma, por novas tecnologias que hoje são um grande problema — disse.
No julgamento que foi interrompido em dezembro, sobre a responsabilidade das redes sociais, nenhum dos dois ministros votou. Por enquanto, votaram apenas os relatores dos casos, Dias Toffoli e Luiz Fux, e Barroso. Todos eles defenderam, com algumas diferenças pontuais, a responsabilização das plataformas, seja ela total ou parcial.
O Supremo julga a constitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet, norma que estabeleceu os direitos e deveres para o uso da internet no Brasil. De acordo com o dispositivo, “com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura”, as plataformas só podem ser responsabilizadas pelas postagens de seus usuários se, após ordem judicial, não tomarem providências para retirar o conteúdo.