Quem entrou no perfil do ex-presidente Jair Bolsonaro no X neste fim de semana em busca de atualização sobre sua alta hospitalar, depois de 23 dias, teve o desprazer de bater os olhos numa foto de sua barriga aberta durante a última cirurgia, com o intestino à mostra. Foto de péssimo gosto, como outras que ele fez questão de postar ao longo desta última internação – e que a coluna se recusa a reproduzir, em respeito à estética, à ética e à privacidade que qualquer paciente deveria ter.
Desde que passou mal no Rio Grande do Norte e precisou ser hospitalizado, Bolsonaro usa as redes sociais não apenas para atualizar seus seguidores, mas com a clara intenção de amplificar o drama de quem ainda sofre as sequelas da facada desferida por Adélio Bispo em setembro de 2018.
Quando ainda era um deputado do baixo clero, Bolsonaro sempre demonstrou apreço pela escatologia -em palavras e imagens. Depois da facada, encontrou no próprio corpo o objeto perfeito para tentar comover seus seguidores/eleitores. São incontáveis as fotos dele sem camisa, exibindo a imensa cicatriz que resultou das sucessivas intervenções que salvaram sua vida.
A cirurgia para correção de aderências no intestino, que por ter parado de funcionar lhe causava dores insuportáveis, foi um show à parte. Seus dias no luxuoso hospital DF Star, em Brasília, foram contados em vídeos, fotos e palavras, com um nível de exposição sem precedentes no mundo político.
Uma coisa é ser transparente e não omitir a gravidade da situação. Outra, bem diferente, é expor as tripas para ganhar simpatia ou, talvez, a piedade dos ministros que em breve irão julgá-lo por tentativa de golpe de Estado. Por coincidência, na próxima quarta-feira haverá uma caminhada pela anistia dos que participaram dos atos violentos de 8 de Janeiro e que servirá também para ele, se condenado.
Sempre que a coisa aperta para o seu lado, Bolsonaro reconta a história da facada, questiona as conclusões da polícia sobre o crime, insiste na teoria conspiratória de que Adélio estava a serviço da esquerda, desprezando as conclusões do inquérito de que o autor da tentativa de homicídio é um doido como tantos outros que tentar matar pessoas famosas – de João Paulo II a Ronald Reagan, para ficar em dois exemplos em que o maluco não alcançou seu objetivo.
Desta vez, o vitimismo de Bolsonaro foi longe demais. Com o consentimento do hospital, seu quarto de UTI virou estúdio para que pudesse participar de uma live com os filhos, fazendo propaganda do capacete de grafeno produzido pela empresa da qual ele e o filho Flavio são sócios. Antes e depois, postou fotos e vídeos com a sonda no nariz e os eletrodos de monitoramento, de Michelle massageando seus pés e da oficial de Justiça que foi entregar a intimação para que apresentasse a defesa no Supremo Tribunal Federal. Nada se iguala à imagem da barriga aberta durante a cirurgia, que até seus eleitores consideraram um exagero e nem os filhos tiveram coragem de reproduzir.