Depois de uma semana fazendo malabarismo para aliviar a barra do presidente do INSS e fingir que não tinha nada a ver com o esquema que por anos roubou todo mês um pedacinho da aposentadoria de milhões de brasileiros, o ministro da Previdência, Carlos Lupi, surgiu na Câmara dos Deputados nesta semana tomado de súbita indignação e clarividência. “Quem fez errado que vá para a cadeia. Eu não estou aqui para acobertar o roubo de quem quer que seja.”
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Era o mesmo Lupi que, diante de todas as evidências de que havia uma quadrilha instalada na cúpula do INSS, resistiu a demitir o presidente do instituto já afastado pela Justiça — e ainda o descreveu como “extremamente qualificado”.
A Polícia Federal mostrou que esse servidor público exemplar ignorou os alertas oficiais de que havia um assalto em curso na instituição que dirigia e ainda atropelou os bloqueios determinados pelo Tribunal de Contas da União para impedir descontos indevidos.
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Por esse esquema, só em 2024 cerca de R$ 2,3 bilhões foram surrupiados da conta de quase 6 milhões de aposentados para pagar a entidades sindicais por serviços que nunca foram contratados — dinheiro que irrigou as contas não só das entidades sindicais, como também de diretores do INSS, lobistas e operadores financeiros. Sem falar que, nos últimos anos, era difícil frequentar o meio sindical sem ouvir falar nesse esquema.
O governo Lula em imagens
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Com a ausência do antecessor, Lula subiu a rampa e recebeu a faixa das mãos do povo — Foto: Hermes de Paula/Agencia O Globo
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Lula se emocionou ao discursar contra a fome, que prometeu erradicar novamente — Foto: Evaristo Sa/AFP
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Presidente Lula, a primeira-dama Janja, em cerimônia de posse de Anielle Franco e Sônia Guajajara como ministras — Foto: Sergio Lima / AFP
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De volta ao mundo. Presidente Lula recebe o chanceler alemão Olaf Scholz no primeiro mês de governo — Foto: Cristiano Mariz/O Globo
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No dia seguinte à tentativa frustrada de golpe de estado, Lula desce rampa do Palácio do Planalto com governadores e representantes dos Três Poderes — Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo/09-01-2023
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Lula acompanha a situação dos Yanomami, povo que vive grave crise sanitária. — Foto: Ricardo Stuckert
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Lula, segundo à esquerda, entrega habitações do Minha Casa, Minha Vida na Bahia com o ministro das Cidades, Jader Filho (à direita da placa): disputa no MDB gera impasse em secretaria — Foto: Joédson Alves/Agência Brasil
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Boa vizinhança. O presidente da Argentina, Alberto Fernández, recebe Lula na Casa Rosada — Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação
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Lula aproveitou visita ao Uruguai para se encontrar com o ex-presidente Pepe Mujica — Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação
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Biden recebeu Lula e a primeira-dama Janja na Casa Branca na sexta-feira — Foto: ANDREW CABALLERO-REYNOLDS/AFP
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Vistos como alternativa de sobrevivência depois da extinção da contribuição sindical obrigatória pelo governo Michel Temer, tanto o consignado como a venda de serviços de seguro ou de auxílio-funeral exigiam que cada aposentado autorizasse descontos em seu contracheque — o que limitava a arrecadação, mesmo com propaganda enganosa ou venda casada.
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O pulo do gato aconteceu quando os intermediários ligados ao INSS começaram a vender aos sindicatos a lista de novos aposentados, que iam direto para suas carteiras de sócios. Foi assim que um grupo seleto de entidades multiplicou sua arrecadação.
Vendo a fartura na concorrência, vários sindicalistas começaram a criar suas entidades para também entrar na farra. Dois deles me disseram que, nos últimos meses, quando começaram a enfrentar dificuldades para cadastrar suas novas entidades no sistema do INSS, procuraram o chefe de gabinete de Lupi, que por sua vez indicou um advogado para “assessorá-los” na tarefa.
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Um desses sindicalistas me mostrou um contrato que disse ter sido entregue pelo advogado, prevendo remuneração de 20% do faturamento. Embora tanto o chefe de gabinete quanto o advogado neguem tudo, esse é exatamente o modus operandi descrito pela PF.
Só Lupi não viu nada. Na Câmara, ele disse que não se julga “responsável institucionalmente” pelo INSS. Ainda justificou o fato de o esquema ter crescido e se multiplicado sob seus olhos com o argumento de que o instituto “não é um botequim da esquina em que você pode enxergar tudo o que está acontecendo”. Isso mesmo tendo dito ao GLOBO, no final de semana, que sabia, sim, do que ocorria, mas era preciso ter “fatos concretos para ser investigados”.
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O histórico de Lupi, que deixou o ministério de Dilma Rousseff em 2011 depois de denúncias de corrupção, não autoriza considerar esse discurso incongruente como atestado de incompetência. Mais provável ser sinal de outra coisa — a confiança de que, aconteça o que acontecer, ele continuará no cargo.
Uma razão para isso poderia ser o fato de ser Lupi quem manda no PDT, que Lula não pode dispensar em momento de fragilidade no Congresso e nas pesquisas de opinião.
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Outra pode ser o fato de, quando se trata de esquema sindical, tudo estar junto e misturado no governo Lula. A entidade que mais aumentou sua arrecadação com o roubo dos aposentados, o Sindinap, tem como vice-presidente o irmão de Lula, Frei Chico. Outra, a Contag, tem ligações históricas com o PT e elege até deputado federal. E outra ainda, Cebap, tem como advogado o filho do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski (depois que os contratos vieram à tona, Lewandowski disse que não há conflito entre a atuação do filho e a sua).
Nos últimos dias, Lula decidiu intervir na Previdência e chamar para si a tarefa de nomear o novo presidente do INSS. Até agora, porém, não demonstra disposição de demitir o ministro — nem de fritá-lo, como já fez com outros auxiliares. Pelo contrário.
Depois da audiência na Câmara, governistas saíram espalhando por Brasília a avaliação de que ele foi bem, saiu das cordas, “convenceu”. Gleisi Hoffmann garantiu que ele fica. Pode até parecer que Lupi não sabe muito bem o que diz, mas ele certamente sabe muito bem o que faz.
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